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segunda-feira, 11 de novembro de 2013

CENTRO DE ESTUDOS ANGLICANOS Uma catequese sobre a homossexualidade*



Pelos Bispos Jack Spong (ECUSA) e Peter J. Lee (África
do Sul)
Escrita a pedido do Arcebispo de Cantuária,
George Carey.



Tradução de +Sumio Takatsu


Há cem anos não havia debates sobre a homossexualidade na vida
da Igreja Cristã. Hoje essa discussão acontece em toda a parte da
cristandade, às vezes, acima do solo, às vezes, debaixo do solo. Em
algumas partes de nossa Comunhão esse debate ameaça separar os
cristãos em campos de batalha. Em nossa Comunhão já ouvimos
ameaças de excomunhão de um lado, e, de outro, convites para
abandoná-la (a Comunhão Anglicana). Temos observado evidências de
que esse debate pode deflagrar palavras danosas e insolentes e até
condutas fisicamente violentas.

 Debaixo dessa discussão colocada em termos bíblicos, morais e
teológicos, acreditamos que há uma divergência na definição da
homossexualidade. Se esta for considerada atividade maléfica optada
pela gente moralmente depravada ou mentalmente doentia e condenada
por Deus, pela Escritura e tradição como sendo pecaminosa, então, a
Igreja dificilmente poderá acomodar-se com esse estilo de vida.
Acomodação seria, nesse caso, a violação de tudo que essa posição
mantém como sendo sagrado. Conforme essa definição, os adeptos
dessa posição considerariam qualquer tentativa de acomodação de gays
e lésbicas por parte de quem quer que seja na Igreja como sendo a
 *

 O presente trabalho foi escrito em 1996, pelos Bispos Peter Lee e Jack Spong, a pedido do então Arcebispo
de Cantuária, George Carey. A proposta de ambos no texto, é de que Lambeth não aprovasse nenhuma
revolução a favor ou contra o tópicos referentes à homossexualidade. De acordo com a argumentação do
texto, qualquer resolução aprovada teria um efeito desastroso na Comunhão Anglicana. Os bispos reunidos
em Lambeth 98 não atenderam à solicitação do texto, e votaram a conhecida resolução sobre o assunto que,
desde então tem sido o ponto de maior polêmica na Comunhão Anglicana.  2
violação da vontade de Deus, como abandono dos princípios cristãos.
Aqueles que adotam essa perspectiva assumem, então, que os que se
lhe opõem não podem ser fiéis a Cristo, à Bíblia e aos valores cristãos.
Portanto, parece natural que eles considerem que seus oponentes
“abandonaram a essência da fé cristã para a abraçar a agenda gay.”

 No outro lado deste debate estão os cristãos que se convenceram
de que, pelas percepções da ciência moderna, a orientação homossexual
é um aspecto natural e normal, embora minoritário, da experiência
sexual humana. Não se trata de alguma coisa que se opta ou de algo
condicionado, mas alguma coisa que é. A homossexualidade é, para
quem mantém esta posição, como ser canhoto, que é estatisticamente
um desvio da norma de vida humana que foi, outrora, causa de
discriminação e perseguição. Estes membros de nossa Igreja sustentam
que a sexualidade é moralmente neutra e que tanto heterossexualidade
quanto homossexualidade podem ser vividas de modo destrutivo ou
construtivo na vida. A posição da Igreja, argumentam eles, deve ser a
de se opor a todos os usos destrutivos do dom da sexualidade humana e
de apoiar aquelas expressões que redundem em vida e plenitude das
pessoas envolvidas. Isso seria sua em relação com os heterossexuais e
homossexuais.

 Os que advogam este ponto de vista acreditam que o
conhecimento disponível às pessoas hoje que surge dos estudos do
cérebro e como este funciona, têm efetivamente desafiado as definições
anteriores. Por exemplo, observa-se que a ciência hoje pode
documentar a presença de homossexualidade entre animais que se
supõem não ter a liberdade de pensar e capacidade de escolha.
Simplesmente, despertam para a homossexualidade. Portanto,
argumentam eles, as pessoas despertam para a homossexualidade. Para
o argumento de que a homossexualidade viola a Escritura esses
membros de nossa Comunhão apresentam um contra-argumento
lembrando a Igreja de outras atitudes antigas encontradas nas
Escrituras que abandonamos por causa das novas descobertas e
atitudes culturais em mudança. A sugestão de que a terra é o centro do
universo, em torno do qual o sol gravita é uma delas. Do mesmo modo,
a legitimidade da escravidão como uma instituição social, a posição de
segunda classe da mulher e a idéia de que a epilepsia é causada pela
possessão demoníaca. Todavia, cada uma dessas questões foi apoiada
pelas citações bíblicas e considerada vontade de Deus.

 Assim temos essa grande linha divisória. A nossa Igreja tem
estimado os bispos fiéis que se colocam em ambos os lados do debate.
Nenhum lado, operacionado com suas definições, pode com integridade  3
comprometer suas posições. Ambas as partes sustentam suas posições
como não só verdadeiras, mas também único meio de ser fiéis a Deus, a
quem se sentem chamados a servir. Os sentimentos esquentam
bastante. As soluções não são fáceis. Há ainda outros membros desta
Comunhão que se colocam com incerteza entre essas duas definições.
Sentem-se incertos e receosos com o presente debate. Não têm
chegado às conclusões firmes e consideram-se desconfortáveis diante
dos que têm suas conclusões. Os membros desse grupo estão lutando
conscientemente para discernir a mente de Deus nessas matérias e não
estão neste momento preparados para tomar decisões.

 Ao tentar evitar a divisão, mas não em detrimento da verdade ou
da busca da verdade – o que não se quer é a supressão da verdade e
limitação da busca da mesma – nós, representantes dos componentes
vastamente diferentes, oferecemos à Conferência de Lambeth a
seguinte proposta:

 Não sugerimos concessões (solução conciliatória), porque não
acreditamos que a concessão seja possível ou que seja um caminho
adequado para alcançar as conclusões morais. Antes oferecemos o
caminho pelo qual os membros desta Igreja possam andar juntos para o
futuro, sem exigir daqueles que sustentam as convicções
diametralmente opostas a sensação de que estão sendo solicitados ou
levados a sacrificar suas convicções ou sua compreensão do Evangelho.
Esta proposta envolve dois passos:

Primeiro, nós como bispos de Lambeth, devemos fazer o esforço
consciencioso para descobrir em nosso presente conflito aquelas áreas
em que ambas as partes possam encontrar acordo substancial.

Segundo, naquelas áreas onde o acordo não é possível, o nosso
compromisso para a com a verdade exige de nós – assim acreditamos –
a exposição de dois pontos de vista competitivos lado a lado tanto
quanto possível, sem juízo de valor, permitindo que se coloquem com
sua integridade, em relevo claro. A descrição exata das questões de
nossa divisão pode provar ser um serviço mais valioso que a
Conferência de Lambeth possa oferecer à Igreja neste tempo.

 Ao procurar atingir este segundo alvo, sugerimos que a Lambeth
1998 não deve colocar em votação a matéria cujo resultado implicaria
em que um lado do debate sai vencendo e outro, derrotado. Em nossa
opinião, a Igreja está bem dividida e a divisão é bem profunda que a
vitória de um lado é apertada e os que se sentem derrotados não vão
aceitar a derrota passivamente. Nenhum desses resultados faria justiça  4
para os indecisos no sentido ter tempo suficiente e espaço para chegar a
uma visão mais clara. Isso redundaria em que o Corpo de Cristo ficasse
ferido e o nosso ministério de testemunho enfraquecido.

 Por outro lado, a Conferência de Lambeth não pode ignorar que
esta questão em debate ou divisão resultante na Igreja e na sociedade
seja assim mesmo relevante ao mundo em que vivemos. Assim, a nossa
proposta consiste em que passemos resoluções onde houver consenso
forte e onde não houver entreguemos as áreas de divergência a um
painel a ser organizado pelo Arcebispo de Cantuária, composto de
líderes articulados de ambas as partes e espectro entre os membros.
Esse painel deve incluir pessoas que a comunidade de gays e lésbicas e
a comunidade evangélica possam reconhecer como seus porta-vozes
autênticos. Então, esse painel poderia continuar com seu trabalho
nessas questões num ambiente mais adequado para a busca das
soluções a longo prazo. Reconhecemos que nem a Conferência de
Lambeth, nem tal painel internacional que a Conferência possa criar têm
autoridade sobre as Províncias de nossa Comunhão. Porém acreditamos
que tal painel pode ajudar as Províncias os organismos interinos na sua
tentativa de tratar apropriadamente essa questão. É nossa esperança
que esse painel terá sucesso em criar um lugar propício onde as vozes
divergentes de nossa Comunhão possam ser ouvidas bem como um
lugar onde a Igreja possa ouvir as fontes profissionais de peritos que
possam iluminar o nosso debate. Também, esse painel pode combinar
aquele dom do mais tempo para examinar essas questões em
profundidade com muitas orações, ao mesmo tempo em que se procura
a orientação do Espírito Santo. É, também, a nossa recomendação que
esse painel seja solicitado a relatar oficialmente á próxima Conferência
de Lambeth, compartilhando não só suas conclusões, se algumas forem
alcançadas, mas também o processo de seu pensamento de modo que
os bispos de nossa Comunhão possam ser informados e nossas
consciências chamadas a qualquer ação que pareça apropriada.

 Em nossas conversações identificamos seis questões principais
que articulam o nosso debate. Acreditamos que é possível alcançar um
consenso nas três questões. Acreditamos que tudo que podemos fazer
com outras três é descrever as diferenças entre nós de modo razoável.
Assim colocamos diante da Conferência de Lambeth, primeiro, as áreas
onde pensamos que o nosso acordo é possível e expressamos a
esperança de que os bispos de Lambeth falem com a voz da unidade
nessas questões. Então, temos a intenção de descrever as áreas de
nossa divergência, procurando somente descobrir a clareza naquelas
coisas que nos dividem profundamente e expor aquelas questões com
integridade que cada lado exige. Então, solicitaremos à Conferência de  5
Lambeth entregar essas questões ao painel designado para maior
estudo.

I. Áreas em que pensamos existir um possível acordo

a) Acreditamos, primeiramente que as pessoas homossexuais são
filhos e filhas de Deus que, com toda a família humana, participam do
amor de Deus e que devem, portanto, ser tratados com imparcialidade,
justiça e igualdade diante da lei. Repugnamos a hostilidade com que os
gays e lésbicas têm sido têm sido tratados pelos cristãos e não cristãos
no decorrer de nossa história. Homossexuais têm sido mortos,
espancados, despedidos de seu trabalho, expulso de suas famílias
simplesmente por serem o que são.

 Também, deploramos aqueles tempos quando a retórica dos
cristãos sugeria que a conduta destrutiva e degenerada que todos nós
condenaríamos seria a conduta padrão de todos os homossexuais.
Reconhecemos que ofensa para com as crianças é um mal do qual os
heterossexuais e homossexuais têm sido culpados. A ofensa à criança é
um mal do qual os heterossexuais e homossexuais têm sido culpados. A
ofensa à criança não e a inclinação de todos, nem da maioria dos
homossexuais e nem mais do que os heterossexuais. Todas as vezes
que a nossa retórica sugere o contrário somos culpados de espalhar a
ignorância e preconceito. Chamamos a Igreja ao arrependimento onde
essas representações errôneas tenham ocorrido e à sensibilidade e
exatidão em todas as futuras conversações. Acreditamos que o povo
cristão em ambas as partes de nosso presente debate pode encontrar
acordo significativo em torno destes primeiros princípios.

b) Segundo, permanecemos juntos em sustentar a sacralidade do
casamento e a importância da unidade familiar em cada sociedade.
Reconhecemos que a sexualidade é um aspecto de nossa humanidade
que pode propiciar tanto a vida quanto a morte aos indivíduos.
Tradicionalmente, a posição da Igreja tem sido de que a sexualidade é
apropriada somente numa relação de compromisso total público entre
um homem e uma mulher. O Ofício do Santo Matrimônio foi designado
para ser o momento em que o compromisso público que foi reconhecido
pelo Estado é abençoado pela Igreja. Não há desejo por parte de
ninguém que conhecemos de enfraquecer ou minar o nosso respeito
pelo Santo Matrimônio. Mesmos aqueles que argumentam que os
benefícios do casamento devam ser abertos para os casais do mesmo
sexo não questionam a beleza, a santidade e poder encontrados nesta
unidade básica da sociedade humana. Embora ainda incapazes de
chegar a um acordo sobre qualquer expansão desta instituição do Santo  6
Matrimônio para incluir os que ainda não estão incluídos, estamos de
acordo que há uma necessidade de chamar a Igreja em toda parte para
apoiar, defender, embasar e fortalecer os laços que mantêm o
casamento. Deploramos a taxa elevada de divórcio em nossas várias
sociedades. Observamos as desigualdades, às quais estão submetidas
as mulheres em redor do mundo, em educação, em oportunidades
profissionais e outras que pertencem ao bem estar social e cultural.
Estamos conscientes de que a Conferência tem dado sua bênção para
aceitar na Igreja unidades de famílias polígamas sob certas condições
em partes de nossa Comunhão. Mas encontramos concordância na
crença de que a relação ideal para homens e mulheres heterossexuais
encontra-se ainda no Santo Matrimônio monógamo e vitalício. Além
disso, acreditamos que a busca da plenitude humana para os
heterossexuais pode bem ser servida pelo compromisso renovado por
parte desta Igreja com o padrão de vida casada monógamo, fiel,
amoroso e vitalício entre um homem e uma mulher e que os
casamentos saudáveis constituem fator importante na criação de filhos
saudáveis. A despeito desse ideal, também reconhecemos que, onde as
exigências da vida assim o requerem, pais e mães solteiros, padrastos,
madrastas e irmãos e irmãs e pais e mães substitutos têm exercido as
tarefas dadas por Deus para a criação de filhos com beleza e santidade
e descobrimos que é causa para a ação de graças.

c) Terceiro, nós acreditamos que uma vasta maioria dos bispos
desta Comunhão está disposta a declarar que qualquer atividade sexual
que seja predatória e indesejada, qualquer padrão de conduta sexual
que procura impor sobre uma pessoa fraca a vontade da pessoa forte
são errôneos e devem ser condenados por esta Comunhão.
Compartilhamos essa convicção seja em relação à conduta de
heterossexuais ou de homossexuais.

 Além disso, acreditamos que há um consenso de que, nesta
Comunhão já existente a ser declarado, a conduta sexual promíscua
praticada por qualquer um é desumanizante para os ambos parceiros,
portanto, errôneo. Afirmamos que o sexo é um dom de Deus
intencionado para ser partilhado numa relação de compromisso último.
Quando esse nível de compromisso na relação estiver ausente o sexo é
banalizado, é negada a santidade humana e a pessoa torna-se objeto a
ser usado, ao invés de ser amada. Acreditamos que a ordem da Criação
estabelecida por Deus é que devemos amar as pessoas de modo
apropriado e usar coisas apropriadamente. Quando essa ordem é
violada e coisas amadas e pessoas usada inapropriadamente,
acreditamos que o propósito da Criação é violado. É nossa esperança  7
que a Conferência de Lambeth possa afirmar esse princípio, condenando
qualquer conduta que seja predatória e promíscua.

II. ÁREAS EM QUE O ACORDO NO MOMENTO NÃO É POSSÍVEL

a) Bênção dos casais do mesmo sexo

É o celibato a única opção para os gays e lésbicas se desejarem
ser cristãos? Aqui as vozes dos bispos são claramente sim e não.
Podemos identificar alguns padrões de conduta sexual para gays e
lésbicas que pudessem ser considerados santos? Mais uma vez, as vozes
são contraditórias em suas respostas. Nesta questão não há uma
concordância á vista. Portanto, procuramos só descrever os pontos de
vista conflitantes.

 Há claramente membros dedicados de nossa Igreja, inclusive os
que têm sido escolhidos para ser nossos bispos, que consideram a
homossexualidade, quando expressa em conduta humana, não só
pecaminosa e errônea, mas também anti-natural. Eles apontam para a
interdependência dos órgãos sexuais masculinos e femininos, para o
papel necessário de ambos os sexos para a reprodução e concluem que
uma orientação sexual direcionada para o seu próprio gênero viola a
ordem criada. E sugerem que, visto que a homossexualidade, na visão
deles, distorção, deve ser receptiva à cura e recomendam tais curas
devem ser buscadas. Se for determinado, em alguma incidência
específica, que não há condição para a cura, então, eles acreditam e
argumentam que a sexualidade deve ser reprimida e considerada como
uma cruz que deve ser carregada como uma das fraquezas e
deformidade humanas consideradas “trágicas”. Qualquer “estilo de
vida”, eles argumentam, que envolva alguma expressão de sexualidade
pelos homossexuais deve ser, portanto, evitada pelos cristãos. Os
cristãos que sustentam este ponto de vista são cuidadosos em afirmar
que não condenam as pessoas, mas somente a conduta. O nosso
propósito neste momento não é o debate sobre essas conclusões, mas
simplesmente expor essa visão aberta e honestamente e com
integridade. É necessário que todos os membros desta Comunhão
saibam que essas conclusões representam as convicções de uma parte
significativa e até numericamente majoritária do povo de nossa
Comunhão.

 Este ponto de vista encontra a oposição por parte de outros
membros desta Igreja que argumentam que essas conclusões levaram,
no passado, à perseguição dos canhotos e à justificação da escravatura
por parte dos cristãos. Eles consideram-nas errôneas e profundamente  8
preconceituosas. Esses argumentos, eles sustentam, criaram aquelas
atitudes e convicções que, no passado, levaram o mundo negar às
mulheres o direito de voto e à busca de formação universitária e carreira
profissional. Estes cristãos sugerem que essa atitude não está baseada
num conhecimento adequado. Em apoio dessa convicção, eles apontam
para a consistência da presença dos homossexuais, na população
humana no mundo, em toda a história registrada. Eles consideram essa
consistência de números como um fato, embora reconheçam que a
homossexualidade tenha sido reprimida em algumas sociedades,
fazendo com que números pareçam menores do que a realidade, e, em
algumas sociedades, aceita e celebrada, fazendo com que os números
maiores do que o fato. Eles consideram os estudos que demonstram ser
conclusiva que a homossexualidade é um dado da vida e não uma
opção. A maioria dos que sustentam esta perspectiva considera como
competentes aqueles estudos que demonstrem conclusivamente que a
homossexualidade não está sujeita à mudança e eles consideram
culpados de conduta fraudulenta e violência pastoral os que procuram
forçar os homossexuais à conduta heterossexual. Eles reconhecem e
honram o celibato como opção para todos, mas consideram que o
mesmo como uma vocação e não como um modo de vida, a que os de
orientação homossexual sejam obrigados quando não são vocacionados.
E argumentam ainda que a energia sexual não deve ser reprimida entre
os heterossexuais bem como entre os homossexuais, a não ser que as
pessoas assim desejar livremente. Portanto, eles argumentam que é
imperativo que a sociedade venha reconhecer essas relações e a Igreja
abençoar as mesmas formadas entre gays e lésbicas como casais
cristãos do mesmo sexo, que desejam viver em relação de fidelidade e
compromisso e que anelam por ter Deus como seu parceiro de uma vida
conjunta. Aqueles que sustentam esta visão acreditam que o fracasso
da sociedade em reconhecer as uniões do mesmo sexo e da Igreja
abençoa-las só serve para desestabilizar o compromisso e para
encorajar conduta promíscua, que todos concordam que não é ideal de
modo algum. Eles propõem que a Igreja elabore liturgias para a bênção
das uniões do mesmo sexo e forme seu clero para ajudar os gays e
lésbicas no seu preparo para a vida de compromisso conjunto e do
sustento desse compromisso assim como se faz no conselho pré-
matrimonial dos heterossexuais. Eles consideram danosa, hostil e
contraproducente para a estabilidade social a tentativa de negar essa
opção de compromisso público aos homossexuais.

 Considerando que essas duas posições são tão distintas,
acreditamos que o debate sobre essa matéria não será produtivo, mas
criaria mais calor do que a luz. Considerando que os pressupostos
subjacentes em cada posição não serão aceitáveis a outra parte,  9
recomendamos que a Conferência de Lambeth deixe de resolver essa
questão de maneira claramente prematura e destrutiva, mas ao invés
disso, refira a matéria, sem juízo de valor, ao painel proposto, a ser
formado a partir desta casa, para o estudo durante a próxima década.

b) Ordenação ao Presbiterado dos gays e lésbicas que vivem em
relações fiéis e monogâmicas

Devem ser ordenados os homossexuais não celibatários? Por não
celibatário ninguém quer dizer “promíscuos”. Antes queremos dizer
alguém que vive a relação de fidelidade e monogamia, dedicado um ao
outro, presumivelmente, vitaliciamente, pode servir à Igreja como
pessoa ordenada?

 Para quem acredita que a homossexualidade é desvio da norma
heterossexual, a resposta é claramente não. Ninguém ordena um estilo
de vida que é um desvio e não é normal. Seria uma afronta à Igreja, se
assim procedesse, afirmam eles. Isso implicaria em estender o status e
o papel de modelo presentes no presbiterado a um modo de vida, o qual
tem sido historicamente condenado pela Igreja como sendo errôneo.
Isso equivaleria considerar santo o que se considera inerente mau.
Aqueles que assim pensam afirmam, também, que considerando ser o
presbítero ser representante de Deus no altar, a ordenação sugeriria ao
povo da Igreja que a homossexualidade pode efetivamente ser vista
como parte do que Deus é. Tal idéia seria impossível para esses
cristãos.. Hoje eles não são capazes nem desejam falar na ordenação
dos gays e lésbicas e não acreditam que essa convicção profundamente
sustentada por eles jamais mudará. Considerar que a Conferência de
Lambeth fale apenas na possibilidade seria para eles uma afronta a tudo
que eles consideram santo.

 Outros cristãos, partindo de uma outra definição, fazem a sua
réplica de que a Igreja já tem homossexuais nas suas três ordens. Eles
fazem a citação de historiadores que reconhecem que os homossexuais
têm feito parte do sacerdócio desde a aurora do Cristianismo. Portanto,
eles afirmam que a questão não está em se a Igreja deve ordenar os
homossexuais, mas se a Igreja deve ser, simplesmente, honesta acerca
das coisas que ela sempre fez.

 Eles acreditam que a homossexualidade é parte natural da vida
humana. Portanto, a parceria gay ou lésbica que seja fiel, monogâmica
e intencionalmente vitalícia pode, efetivamente, satisfazer uma das
exigências da ordenação de ser “exemplo salutar para o rebanho de
Cristo”. Além disso, eles afirmam que a Comunhão Anglicana expressa- 10
se em amplamente variadas diferenças culturais. Eles apontam para o
fato de que, em algumas partes do mundo cristão, a homossexualidade
é não só aceita, mas também abertamente considerada parte da criação
de Deus. Nessas partes do mundo, há comunidades de fé que estão
preparadas para aceitar como seus sacerdotes e diretores espirituais os
cristãos gays e lésbicas, que têm sido chamados por Deus e
reconhecidos pelo processo decisório da Igreja. Eles ressaltam que, em
alguns contextos urbanos no mundo ocidental, a falha em prover acesso
aberto a todas as pessoas qualificadas para todos os aspectos da vida
da Igreja resulta num retrocesso do Ministério de Cristo. Além disso,
eles mencionam a experiência de certos bispos urbanos proclamam que
o ministério de presbíteros abertamente homossexuais, que, em
algumas instâncias, vivem em relações monogâmicas, foram marcados
com integridade e efetividade e que têm servido para enriquecer a
Igreja.

 Mais uma vez, nós reconhecemos que estas duas visões são
mutuamente exclusivas. Um lado pensa que outro lado está
“abençoando o que Deus condena e está denominando o mal de bem”.
Outro lado acusa que o preconceito e a ignorância têm cegado alguns
cristãos de modo que não podem reconhecer a rejeição e ofensa mal
informada de sua própria retórica e conduta. Esta questão não se presta
para concessão e a divisão é tão profunda que, claramente, exige mais
tempo e mais estudos. Por essas razões recomendamos que essa
questão e dois pontos de vista em conflito podem ser discutidos, se essa
for a mente da Conferência, mas, então, sejam referidos, sem voto, ao
painel continuador que esperamos seja designado pelo Arcebispo de
Cantuária.

c) Autoridade da Bíblia

Implícita nestas divergências esta uma terceira questão, sobre a
qual não podemos encontrar um consenso. Isso tem a ver com as visões
sobre o uso e autoridade da Sagrada Escritura. A Bíblia poderá,
certamente, ser lida para a condenação da prática homossexual. Ambas
as partes admitem isso. Para alguns membros desta Comunhão isso é
tudo que se exige de seu juízo e opinião. Eles acreditam que a verdade
final de Deus encontra-se na Sagrada Escritura que eles acreditam ser a
auto-revelação de Deus. Outros cristãos argumentam que a Bíblia
chama-nos, também, para além das barreiras e preconceitos que,
outrora, excluíram da plenitude da vida da Igreja os gentios,
samaritanos, leprosos, gente ritualmente impura, mulheres, canhotos,
minorias raciais e os suicidas. A rejeição dos homossexuais por parte da
Igreja é apenas mais um preconceito que cita a autoridade da Bíblia,  11
afirmam eles. Estes membros de nossa Comunhão se opõem a uma
interpretação literal da Bíblia. Porém é necessário que se diga que
ambas as partes valorizam altamente a Bíblia e nenhum lado
recomendaria nem adoração da bíblia como um ídolo e nem que seja
colocada de lado como irrelevante.

Todavia ambas as acusações têm sido feitas neste debate. O uso
apropriado da Bíblia está, por conseguinte, em debate e isso se torna a
terceira questão, sobre a qual esta Comunhão não pode chegar a um
consenso. Todavia como decidimos esta questão influi, claramente, no
como outras duas questões são decididas. Assim solicitamos esta
questão seja, também, referida ao painel a ser designado.

Se a Conferência de Lambeth debater essas questões conflitantes
e forçar o voto de um modo ou de outro, o resultado será amargura e,
certamente, o relatório da minoria será divulgado por parte dos
perdedores.

O nosso senso é que, com tempo, paciência e estudo, esta Igreja
é capaz de chegar a um consenso nessas questões, de um modo ou de
outro, embora não esteja no horizonte. Apenas solicitamos que a
Conferência de Lambeth propicie a esta opção possibilidade, neste
momento, proporcionando-lhe meios a serem criados e feitos
disponíveis a esta Comunhão.

Enquanto o debate sobre estas três questões cruciais continua
irresolúvel, cremos que podemos ainda progredir conduzindo o debate
de modo que se revela o amor Deus para todo o povo de Deus.
Apelamos aos Bispos da Comunhão Anglicana que abaixem os decibéis
da retórica hostil, procurarem respeitar os outros, cujas opiniões
honestas os colocam contra outros cristãos e tentem evitar as ofensas a
qualquer parte do Corpo de Cristo. Apelamos aos bispos que acreditam
que a homossexualidade é um mal tenham o tempo para se encontrar
com gays e lésbicas cristãos que se sentem ser tratados, às vezes,
como quem bate a porta da Igreja que os rejeita e ainda se considera
ser o Corpo de Cristo e conhecê-los melhor. Apelamos aos bispos que
acreditam que os gays e as lésbicas devem receber plena acolhida na
vida da Igreja para que, sem julgamento algum, saiam ao encontrar dos
cristãos que acreditam que a homossexualidade é tão má que qualquer
acomodação representaria violação do seu compromisso com Cristo e os
conheçam melhor. É necessário que ambas as partes entrem no mundo
do outro para entender o temor do outrem e compartilhar seus
sofrimentos como agentes redentivos do Encarnado, que veio a nós
muito antes que mereçamos esse dom gracioso.  12

É nossa esperança e oração que a Comunhão Anglicana através de
exemplo de seus bispos possa ser modelo de um método de lidar com
conflito, mesmo conflito dilacerador, isto é, tratar dignamente as
pessoas com as quais discordamos, reconhecer como legítimos os
pontos de vista competitivos e, aparentemente, irreconciliáveis que nos
dividem e mantê-los em tensão dinâmica e nos comprometer a viver de
modo orante para as soluções, confiantes de que o Deus a quem
servimos nos guiará, oportunamente, à verdade de Deus.

Se a Conferência de Lambeth pode passar resoluções sobre
aqueles três pontos, em torno das quais, acreditamos haver consenso
substancial e referir para estudo futuro aquelas três questões sobre as
quais não se encontra nenhum consenso, cremos que esta Igreja será
bem servida.

Também esperamos que a Conferência de Lambeth vote
simplesmente para receber este trabalho, sem julgamento, e
recomenda-lo a todo o povo de nossa Comunhão para o estudo, não
como palavra final nem como palavra infalível, mas simplesmente como
uma declaração sobre onde acreditamos que a Igreja se encontra
atualmente. Oferecemo-lo na esperança de que seja útil à medida que
esta Comunhão procura crescer em nossa vocação para sermos fiéis a
Deus que nos chama para o serviço.

+ Peter John Lee +John Shelby Spong, Diocese de Newark,
USA
Diocese do Cristo Rei
África do Sul

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