O evangelho proposto para este final de semana é a
respeito do conteúdo da oração e sobre como orar com perseverança e
confiança.
De um lado, as orientações de Jesus a respeito da
oração estão imediatamente após a catequese sobre o mandamento do amor
(Lucas 10,25-28) colocado em prática através da solidariedade (Lucas
10,29-37), do serviço e do seguimento (Lucas 10,38-42). A comunhão com o
Espírito de Deus cultivada na oração é a fonte do amor, da
misericórdia, da diaconia e do discipulado.
De outro lado, as orientações de Jesus a respeito da
oração encontram-se imediatamente antes da expulsão de um demônio de uma
pessoa muda (Lucas 11,14). Seu poder de cura está intimamente vinculado
à sua oração (Lucas 11,1) e à fé das pessoas (Lucas 7,50; 17,19;
18,42).
Podemos dividir a catequese sobre a oração em três partes.
1. A oração de Jesus e dos/as discípulos/as (Lucas 11,1-4)
Jesus é uma pessoa de profunda oração. Ele rezava
muito, seja em momentos decisivos de sua vida, seja no cotidiano. Estava
sempre em busca de comunhão com o Pai. Nessa intimidade filial, estava o
segredo de sua missão.
Em Mateus, temos sete pedidos no Pai-nosso (Mateus
6,9-13). Em Lucas, são cinco. Lucas deve estar mais próximo da oração
que Jesus sempre rezava. A comunidade de Mateus acrescentou o desejo de
que a vontade de Deus fosse realidade assim na terra como já é no céu. É
que os judeus cristãos não podiam deixar a Lei de Deus fora do
Pai-nosso. E a forma como o fizeram foi através do terceiro pedido. Mas
como deixar o pedido pelo Pão-nosso no coração da oração de Jesus?
Então, para manterem ímpar o número dos pedidos, repetiram o último em
forma afirmativa: "Mas livra-nos do maligno" (Mateus 6,13). Desse modo, o
Pão-nosso continuava no centro da oração de Jesus e de seus discípulos.
Diferentemente de Mateus, onde Jesus toma a
iniciativa de ensinar o Pai-nosso (Mateus 6,7-9), em Lucas, depois de
acompanhar Jesus em oração, um seguidor lhe pede que também ensine o seu
segredo aos discípulos. "Senhor, ensina-nos a orar". Então, Jesus lhes
revela o seu jeito de se relacionar com o Pai. E partilhou a sua
experiência. Esta oração é a síntese de seu projeto.
Nos dois primeiros pedidos, Jesus nos propõe acolher o
Pai com o seu projeto, expresso por seu nome e pela justiça do reino.
Nos três pedidos seguintes, Jesus nos pede que, da mesma forma como ele,
também nós respondamos ao Pai, vivendo novas relações entre nós.
Pai
Abbá quer dizer paizinho, papai querido, tal como as
crianças se dirigem a seus pais. É uma relação de confiança, de entrega e
de intimidade. É um pai que gera vida, que acolhe e perdoa, que cria
para a liberdade. Chamando a Deus de paizinho, reconhecemos também a
nossa filiação divina, pois Jesus disse que o seu Pai também é nosso Pai
(João 20,17).
1.1. Santificado seja o teu nome
Para o povo da Bíblia, o nome representa a própria
pessoa. Santificar, portanto, o nome de Deus é o desejo de se
comprometer com ele, de tornar realidade o seu nome, Abbá. Ser filho e
filha desse paizinho nos leva a ter com ele uma relação de confiança e
de liberdade. Leva-nos a revelar a sua glória, que se manifesta na vida
do povo, especialmente dos mais fracos. Leva-nos também a viver
plenamente como pessoas libertas e engajadas na luta pelo direito de
todas as pessoas de serem verdadeiramente livres de todas as formas de
escravidão, de todos os ídolos mundanos que nos tornam seus escravos.
Seu nome também é Javé. "Assim serei lembrado de
geração em geração" (cf. Êxodo 3,14-15). Santificar o seu nome é
atualizar sua presença libertadora na luta pela dignidade do povo
excluído pelo sistema opressor do Egito. Quais sãos os sistemas que hoje
nos escravizam, grandes ou pequenos?
1.2. Venha o teu Reino
Desejar o Reino é abrir-se para acolher o projeto de
justiça e de amor vivido por Jesus, a fim de concretizá-lo aos poucos em
nosso dia a dia. Viver segundo o Reino é deixar-se conduzir por seu
Espírito, ao ponto de ter vida em abundância e de podermos dizer com o
apóstolo Paulo que "já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim"
(Gálatas 2,20).
1.3. O pão nosso cotidiano nos dá dia a dia
Este é o pedido central do Pai-nosso. Ao colocar o
pedido pelo pão no coração de sua oração, Jesus nos mostra que o pão
repartido, isto é, a economia não acumulada é o centro do projeto de
Deus. Definitivamente, a economia está no centro do plano de Deus, uma
economia solidária, partilhada, não acumulada.
O significado do pão é mais amplo e se refere também a
todas as necessidades fundamentais para vivermos com a dignidade de
filhas e filhos de Deus, tais como as seis necessidades lembradas por
Jesus em Mateus 25,35-36: comida, água, casa, roupa, saúde e liberdade. E
mais. É também o pão repartido na Santa Ceia.
1.4. E perdoa os nossos pecados, assim como também nós perdoamos a todo o que nos deve
O perdão de Deus é incondicional. Jesus revelou o
amor do Pai, doando sua vida livremente, porém, na fidelidade ao projeto
do Reino. Da mesma forma, este pedido do Pai-nosso nos convida a
exercermos a misericórdia com perdão pleno, garantindo, dessa forma,
vida digna a todas as pessoas, não permitindo que as dívidas sejam causa
de sofrimento e humilhação. Somente pessoas reconciliadas podem viver
relações harmoniosas e de justiça.
A misericórdia de Deus é sem limites. Ele está sempre
pronto para perdoar, até mesmo em situações limite, como o caso em que
Jesus perdoa a seus algozes: "Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que
fazem" (Lucas 23,34). No entanto, só é capaz de acolher o seu perdão
quem for capaz de também perdoar. Somente a atitude de humildade nos
abre para acolher o perdão infinito do Pai. O Pai do filho perdido já
estava oferecendo seu perdão desde a hora em que ele decidiu seguir
outro caminho. Porém, o filho somente experimentou a misericórdia do Pai
no momento em que caiu em si e se abriu ao perdão gratuitamente
oferecido pelo Pai (Lucas 15,11-32).
1.5. E não nos conduzas para a tentação
Jesus deixou bem claro quais são as principais
tentações do maligno e que impedem vivermos conforme as relações do
Reino. No relato das tentações, Jesus nos revela as principais seduções
que nos afastam do caminho de Deus: a ganância da riqueza, a ambição do
poder, a glória do prestígio e soluções mágicas para resolver a fome
(Lucas 4,1-13). Para fazer frente a essas tentações, Jesus nos propõe o
caminho da partilha da riqueza, do poder colocado a serviço e da
simplicidade no viver.
2. Orar com insistência, com perseverança (Lucas 11,5-10)
Com a parábola do amigo importuno, Jesus revela mais
características da oração, isto é, a insistência e a perseverança, de um
lado, e, de outro, a certeza de sermos escutados, diante da
solidariedade e da gratuidade de Deus. Por isso, "peçam e receberão;
procurem e encontrarão; batam, e a porta será aberta para vocês. Porque
todo o que pede, recebe; todo o que procura, encontra; e, para quem
bate, se abrirá".
Jesus nos desafia a orarmos com perseverança, pois a
oração não pretende mudar Deus, uma vez que ele sabe o que precisamos. A
oração pretende mudar a nós. Se custamos a receber e a encontrar, se a
porta custa a se abrir, será que não somos nós que custamos a mudar
nossas mentes e nossos corações?
3. Pedir o Espírito Santo com confiança (Lucas 11,11-13)
Se as pessoas atendem aos seus amigos e familiares,
se os pais não negam pão e peixe a seus filhos, muito mais o Pai do céu
atenderá as necessidades de suas filhas e de seus filhos. O jeito de
Deus ser Pai supera o jeito humano. Ele é Pai como na narrativa do filho
perdido. Cria seus filhos para a liberdade. Quando erram, espera-os de
braços abertos para acolhê-los no amor e com eles fazer festa.
Por fim, Jesus recomenda que peçamos o essencial ao
Pai, isto é, o seu Espírito. É que ele é a força de Deus que animou a
profecia no Antigo Israel (Isaías 61,1). Ele é o dinamismo que enviou
Jesus de Nazaré anunciar uma boa-nova aos pobres (Lucas 4,18-19). É ele
também a nossa força para testemunharmos, até os confins da terra, o
projeto do Reino que Jesus viveu e anunciou (Atos 1,8).
E o Espírito de Jesus está aí da mesma forma como o
sol a brilhar. E como a luz solar entra em uma casa? Ora, abrindo portas
e janelas. Portanto, deixar que a luz do Espírito ilumine nossos passos
está em nossas mãos. Sua força a conduzir nossas vidas será tanto maior
quanto mais nos abrimos através da oração filial na busca de comunhão
com nosso papai querido.
Por isso,
Pai,
Santificado seja o teu nome;
Venha o teu Reino;
O pão nosso cotidiano nos dá dia a dia;
E perdoa os nossos pecados, assim como também nós perdoamos a todo o que nos deve;
E não nos conduzas para a tentação.
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