O ambiente estava tenso. Era a última ceia de Jesus
com seus discípulos. Judas já tinha decidido trair Jesus. Os outros
estavam com medo, sem entender os acontecimentos. Mas estas contradições
tão dolorosas não impediram a Jesus de renovar a Aliança. O seu amor
era maior que as falhas e as fraquezas dos amigos.
Lucas descreve a paixão, morte e ressurreição de
Jesus. Inicia-se a etapa final do "êxodo" de Jesus, anunciado por Moisés
e Elias no Monte da Transfiguração. A maneira de Lucas descrever os
acontecimentos é semelhante àqueles filmes que, primeiro, mostram a cena
de longe. Em seguida, pouco a pouco, eles ajustam a câmera e a cena vai
chegando mais perto, até que se possam ver todos os detalhes. Assim
faz Lucas. Desde o capítulo 9, ele vem dizendo que Jesus está indo para
Jerusalém. E agora, uma vez em Jerusalém, ele vai ajustando a câmera no
ponto em que os leitores e as leitoras devem prestar mais atenção:
Primeiro, ele diz: "Aproxima-se a festa dos ázimos, chamada Páscoa" (Lc
22,1). Em seguida, informa: "Chegou o dia dos ázimos" (Lc 22,7). E
finalmente, constata: "Quando chegou a hora, ele sentou à mesa" (Lc
22,14). Este é o ponto onde Lucas quer que a gente preste toda a
atenção, pois é o momento em que começa a Páscoa, o êxodo de todos.
COMENTANDO
1. Lucas 22,14-18: Início da Ceia Pascal
"Desejei ardentemente comer esta Páscoa com vocês!" É
como se dissesse: "Até que enfim! Chegou o momento que tanto desejei!"
Jesus tem o desejo ardente de levar a bom termo o projeto do Pai. É a
última vez que ele está reunido com seus amigos. É a Páscoa definitiva,
em que ele celebra a Nova Aliança e realiza a passagem da opressão da
antiga lei para a revelação da lei do amor. Jesus enche um cálice de
vinho e o distribui aos amigos. Beber o cálice significa cumprir a
missão recebida do Pai (Mc 10,38-39; Jo 18,11). Jesus bebe o cálice que o
Pai lhe deu e pede que seus amigos participem.
2. Lucas 22,19-20: A instituição da eucaristia
O último encontro de Jesus com os discípulos
realiza-se no ambiente solene da celebração tradicional da Páscoa. Eles
estão reunidos para comer o cordeiro pascal e, assim, lembrar a
libertação da opressão do Egito. O contraste é muito grande. De um lado,
os discípulos: eles estão inseguros, sem entenderem o alcance dos
acontecimentos. De outro lado, Jesus que faz um gesto de partilha,
convidando seus amigos a tomar o seu corpo e o seu sangue. Ele distribui
o pão e o vinho como expressão do que ele mesmo está vivendo naquele
momento: doar sua vida, distribuir-se aos outros para que eles possam
viver, revelar o amor do Pai. Este é o sentido da eucaristia: aprender
de Jesus a distribuir-se, doar-se, entregar-se, servir, sem medo dos
poderes que ameaçam a vida. E Jesus acrescenta uma frase que só Lucas
conservou: "Fazei isto em memória de mim" (Lc 19,22).
3. Lucas 22,21-23: Anúncio da traição de Judas
Estando reunido com os discípulos pela última vez,
Jesus anunciou: "A mão daquele que me trai está comigo sobre a mesa".
Este jeito de falar acentua o contraste. Para os judeus a comunhão de
mesa era a expressão máxima da amizade, da intimidade e da confiança. Em
outras palavras, Jesus vai ser traído por alguém muito amigo! E ele
acrescenta: "Sim, o Filho do Homem vai morrer, segundo o que foi
determinado!" Aqui não se trata de predestinação nem de fatalismo.
Trata-se da certeza que a experiência humana de séculos nos comunica:
num mundo organizado a partir do egoísmo, quem decide viver o amor vai
morrer crucificado. E Jesus termina: "Ai daquele homem por quem o Filho
do Homem foi entregue!" Será para sempre conhecido e lembrado como o
traidor de Jesus!
ALARGANDO
A grande luta. De um lado, Jesus. Animado
pelo Espírito de Deus, ele procura realizar o projeto do Pai. Do outro
lado, os inimigos de Jesus. Animados pelo espírito oposto, procuram
realizar o projeto de satanás. "Satanás entrou em Judas" e o levou a
conferenciar com os sacerdotes, que estavam procurando um meio para
eliminar Jesus, mas temiam o povo. Combinaram o preço e Judas começou a
procurar um jeito de entregá-lo. É na última ceia que as duas forças se
encontram e se enfrentam! Jesus diz: "A mão que me trai está comigo
sobre a mesa". Por de trás da luta entre os homens está a luta entre os
poderes. O vencedor será Jesus.
Lucas acentua a semelhança entre o êxodo e a paixão,
morte e ressurreição de Jesus. No êxodo antigo, conduzido por Moisés,
Deus libertou o povo da lei do faraó que oprimia e escravizava o povo.
No novo êxodo, conduzido por Jesus, Deus liberta o povo da escravidão da
lei, que o impedia de perceber e de experimentar o amor acolhedor de
Deus como Pai. No antigo êxodo, nasceu o povo, feito de muitas raças e
tribos diferentes. O que os unia e fazia deles um só povo era a fé comum
em Javé, o Deus libertador. No novo êxodo, nasce um novo povo, feito de
muitas raças, culturas e etnias. O que nos une não é o sangue nem a
raça, mas sim a fé comum em Jesus. Ele nos revelou a misericórdia e a
ternura do Deus libertador que não exclui a ninguém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário