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terça-feira, 15 de outubro de 2013

Viver em gratidão: Sinal da presença do Reino (Lucas 17, 11-21) Carlos Mesters e Mercedes Lopes

VIVER EM GRATIDÃO
SINAL DA PRESENÇA DO REINO
Lucas 17,11-21

OUVIR A PALAVRA DO EVANGELHO DE LUCAS QUE TRAZ LUZ PARA A NOSSA VIDA
No texto de hoje, Lucas informa que Jesus curou dez leprosos, mas um só veio agradecer. E este era um samaritano! Sinal de que os nove outros, galileus e judeus, não estavam acostumados a dizer "Muito obrigado!" Achavam normal receber as coisas. Os samaritanos, que não eram judeus, tinham mais facilidade para agradecer. Hoje também tem gente como os judeus que diz: "Não digo muito obrigado, porque é a obrigação dele!" E tem gente como o samaritano que vive dando graça por tudo que tem e recebe na vida.

SITUANDO
Jesus, o peregrino, continua a sua viagem até Jerusalém. Continua tirando as desigualdades que os homens criaram. Continua a longa e dolorosa caminhada da periferia para a capital, de uma religião fechada sobre si mesma para a religião aberta que sabe acolher os outros como irmãos e irmãs, filhos e filhas do mesmo Pai. Esta abertura vai aparecer no acolhimento dado aos dez leprosos.
No texto de hoje, aparece como assunto muito próprio de Lucas, a gratidão. Saber viver em gratidão e louvar a Deus por tudo que dele recebemos. Por isso, Lucas fala tantas vezes que o povo ficava admirado e louvava a Deus pelas coisas que realizava. Além disso, no Evangelho de Lucas, há vários cânticos e hinos que expressam esta experiência de gratidão e reconhecimento (Lc 1,46-55; 1,68-79, 2,29-32).
COMENTANDO
Lucas 17,11: Jesus em viagem para Jerusalém
Lucas lembra que Jesus estava de viagem para Jerusalém, passando da Samaria para a Galiléia. Desde o começo da viagem até agora, Jesus andou pela Samaria. Só agora está saindo da Samaria, passando pela Galiléia para poder chegar em Jerusalém. Isto significa que os importantes ensinamentos, dados nestes capítulos de 9 até 17, foram todos dados em território que não era judeu. Ouvir isto deve ter sido motivo de muita alegria para as comunidades de Lucas, vindas do paganismo.
Lucas 17,12-13: O grito dos leprosos
Dez leprosos aproximam-se de Jesus, param ao longe e gritam: "Jesus, mestre, tem piedade de nós!" O leproso era uma pessoa excluída. Não podia aproximar-se dos outros. Qualquer toque num leproso causava impureza e criava um impedimento para a pessoa poder dirigir-se a Deus. Através do grito, eles expressam a fé de que Jesus pode curá-los e desenvolver-lhes a pureza. Obter a pureza significava sentir-se novamente, acolhido por Deus, opder dirigir-se a Ele para receber a bênção prometida a Abraão.
Lucas 17,14: A resposta de Jesus e a cura
Jesus responde: "Vão mostrar-se aos sacerdotes!" Era o sacerdote que devia verificar a cura e dar o atestado de pureza. A resposta de Jesus exige muita fé da parte dos leprosos. Devem ir ao sacerdote como se já estivessem curados, quando, na realidade, o corpo deles continuava coberto de lepra. Mas eles acreditam na palavra de Jesus e vão em direção ao sacerdote. E acontece que, enquanto vão caminhando, manifesta-se a cura. Ficam purificados.
Lucas 17,15-16: Reação do samaritano
Dos dez, só um volta para louvar a Deus e agradecer a Jesus. E este é um samaritano. Por que os outros não voltam? Por que só o samaritano? Na opinião dos judeus de Jerusalém, o samaritano não observava a lei como devia. Entre os judeus havia uma tendência que levava o povo a observar a leipara poder merecer a vida eterna. Pela observância, eles iam acumulando méritos e créditos diante de Deus. Gratidão e gratuidade não fazem parte do vocabulário de pessoas que vivem assim o seu relacionamento com Deus. Elas acham tão normal receber algum favor, que nem sequer agradecem! O samaritano representa as pessoas que têm consciência clara de que nós, seres humanos, não temos mérito nem crédito diante de Deus. Tudo é graça, a começar pelo dom da própria vida! Hoje são os pobres que fazem o papel de samaritano e nos ajudam a redescobrir esta dimensão da gratuidade da vida.
Lucas 17,17-19: Observação de Jesus
Jesus estranha: "Os dez não ficaram purificados? Onde estão os outros nove? Não houve quem voltasse para dar glória a Deus, a não ser este estrangeiro!" Para Jesus, agradecer aos outros pelo benefício recebido é uma maneira de dar a Deus o louvor que lhe é devido. Neste ponto, os samaritanos davam lição nos judeus. Hoje, são as pessoas que não fazem parte da comunidade que dão lição em nós! Tudo que recebemos deve ser visto  como um dom de Deus que vem até nós através do irmão e da irmã.
Lucas 17,20-21: O Reino no meio de nós
Lucas acrescenta aqui uma discussão entre Jesus e os fariseus sobre a data da vinda do Reino. Os fariseus achavam que o Reino só poderia vir quando o povo tivesse chegado à perfeita observância da Lei de Deus. A vinda do Reino seria recompensa de Deus pelo bom comportamento do povo. E o messias viria de maneira bem solene como um Rei, recebido pelo seu povo. Jesus diz o contrário. A chegada do Reino não pode ser observada como se observa a chegada dos reis da terra. Para Jesus, o Reino de Deus já chegou! Já está no meio de nós, independentemente do nosso esforço ou mérito. Jesus tem outro modo de ver as coisas. Tem outro olhar para ler a vida. Ele prefer o samaritano que vive na gratidão aos nove que acham que merecem o bem que recebem de Deus.
ALARGANDO
O significado do gesto do samaritano para as comunidades de Lucas. Nas comunidades de Lucas a maioria das pessoas tinha vindo do paganismo. Mesmo depois de haverem acolhido e evangelho e de serem batizadas, suportavam o desprezo dos cristãos de origem judaica. A mancha de haverem seido pagãos permanecia. Essa era também a experiência do samaritano. Foi curado da lepra e podia agora participar da vida da comunidade, mas continuava nele a mancha de ser samaritano, que ninguém poderia tirar. A experiência de ser um eterno excluído aumenta nele a capacidade de reconhecer o dom do acolhimento dado por Jesus. Por isso, volta para agradecer.
A acolhida dada aos samaritanos no Evangelho de Lucas. Para Lucas, o lugar que Jesus dá aos samaritanos é o mesmo que as comunidades devem reservar aos pagãos. Jesus apresenta um samaritano como modelo de gratidão e de amor ao próximo. Isto devia ser muito chocante, pois para os judeus samaritano ou pagão era a mesma coisa. Não podiam ter acesso aos átrios interiores do Templo de Jerusalém nem participar do culto. Eram considerados portadores de impureza, impuros desde o berço. Para Lucas, porém, a Boa Nova de Jesus dirige-se, em primeiro lugar, às pessoas e grupos considerados indignos de recebê-la. A salvação de Deus que chega até nós em Jesus é puro dom. Não depende dos méritos de ninguém.
A lepra e a busca da pureza no tempo de Jesus. Os leprosos eram marginalizados, desprezados e excluídos do direito de conviver com suas famílias. Segundo a lei da pureza, eles tinham que andar com roupa rasgada e cabelos desgrenhados e ir gritando: "Impuro! Impuro!" Para os leprosos, a busca da cura significava o mesmo que buscar a pureza para poder ser reintegrados na comunidade e entrar no santuário.


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