Somente no mês de maio deste ano, Dilma esteve, oficialmente, duas vezes reunida com a senadora
Kátia Abreu (PSD/TO) e reservou tempo em sua agenda para cinco encontros com representantes dos ruralistas, inimigos históricos dos povos indígenas. Mas em todo o seu governo, não recebeu uma vez sequer as lideranças indígenas!
A denúncia é do CIMI (Conselho Indigenista Missionário):
O Governo Federal dá mostras cada vez mais evidentes
que não entende e que não está disposto a entender os povos indígenas
brasileiros. As medidas anunciadas pelo governo com o intuito de superar
os conflitos em torno das questões indígenas no Brasil parte do
pressuposto equivocado segundo o qual os povos indígenas estariam
causando os conflitos e agindo sob o comando de organizações não
indígenas, de modo especial o Cimi. Além de preconceituosa e racista,
uma vez que considera os povos seres inferiores e incapazes de decisões
próprias, o pressuposto é sociologicamente falho. Julgamos que algumas
informações acerca da realidade que envolve a temática são importantes e
suficientes para entendermos a situação. Vejamos.
O governo Dilma aprofundou o processo de retração de
demarcações das terras indígenas. É o governo que menos demarca terras
indígenas desde a ditadura militar. O governo também tomou medidas
administrativas lesivas aos direitos dos povos, tais como a Portaria
419/11, a Portaria 303/12 e o Decreto 7957/13. A presidente Dilma ainda
não recebeu os povos indígenas para qualquer conversa ao longo destes
mais de dois anos de mandato. No entanto, somente no mês de maio, a
presidenta reservou tempo em sua agenda para ao menos cinco encontros
com representantes dos ruralistas, inimigos históricos dos povos
indígenas. Somente em maio, Dilma esteve, oficialmente, duas vezes
reunida com a senadora Kátia Abreu (PSD/TO), presidente da Confederação
Nacional da Agricultura (CNA). Os povos indígenas sabem que a CNA
representa o ruralismo anti-indígena, responsável pelo ataque à
legislação ambiental, que resultou na aprovação do novo Código Florestal
em 2012, e pelo atual ataque aos seus direitos no Congresso Nacional.
A bancada ruralista ataca os direitos dos povos por
meio de diferentes instrumentos na Câmara dos Deputados e no Senado
Federal. Há mais de uma centena de proposições legislativas contrárias
aos direitos dos povos em tramitação nas duas casas do Congresso. Dentre
elas destacam-se as Propostas de Emendas Constitucionais 215/2000,
038/1999 e 237/2013. Os povos indígenas sabem que os ruralistas querem
fazer com a PEC 215/2000, hoje, o mesmo que fizeram com o Código
Florestal em 2012. Flexibilizar os direitos dos povos e ter nas próprias
mãos o poder para não demarcar as terras indígenas no país.
Os povos indígenas, acampados em beiras de estradas
ou confinados em reservas diminutas, tem demonstrado uma resistência e
uma paciência históricas diante das violências do agronegócio e da
parcimônia do Governo Federal. No entanto, certamente não estão
dispostos a continuar sobrevivendo em condições sub-humanas, morrendo
vítimas de desassistência, de assassinatos, de suicídios e de
atropelamentos, exilados de suas terras até o fim de sua existência
enquanto pessoas e povos.
Demarcações paralisadas pelo Governo Federal e
ruralistas no ataque para impedir novas demarcações, rever as
demarcações já realizadas e explorar as terras demarcadas. É isso que os
povos indígenas enxergam na conjuntura político indigenista do Brasil. É
contra este ataque sincronizado do Governo Federal e do agronegócio que
os povos reagem na perspectiva de que seus direitos sejam preservados e
efetivados. Uma reação, portanto, em legítima defesa de suas
existências enquanto indivíduos e povos.
Será tão difícil para Dilma e seu governo entender
isso? Sem falar com os povos e falando a todo o momento com o
agronegócio, Dilma e seu governo continuarão sem entender os 305 povos
indígenas existentes em nosso país.
Assim, partindo de um pressuposto equivocado, o
governo adota e anuncia medidas equivocadas para tentar resolver os
conflitos por ele criados.
Protelar reintegrações de posse não irá resolver o
conflito. Os povos já foram expulsos pelos fazendeiros de suas terras e
nem por isso deixaram de lutar pelo retorno às mesmas. Não será a
expulsão pelas forças do Estado, com dois ou três dias de protelação,
que mudará a relação dos povos com suas terras tradicionais.
Mudar o processo de demarcação das terras indígenas
não irá resolver o conflito. Essa medida irá aprofundar ainda mais a
retração nas demarcações, uma das causas centrais destes conflitos. Os
povos indígenas sabem que a protelação das demarcações é parte da
estratégia dos ruralistas, que querem "ganhar tempo" enquanto eles atuam
para ter o poder acerca das não demarcações das terras, que se daria
com a aprovação da PEC 215/2000.
Por fim, amordaçar o Cimi não irá resolver o
conflito. Primeiro porque os povos são autônomos, cientes e senhores de
suas decisões e do que é necessário para defender seus direitos. Segundo
porque o Cimi não deixará de denunciar os ataques desferidos pelo
governo e pelos ruralistas contra os povos indígenas no Brasil. O Cimi
faz isso desde 1972 quando foi criado, em plena ditadura militar, e o
fará até o último suspiro de sua existência. O compromisso do Cimi é com
a vida dos povos indígenas.
Para resolver efetivamente os conflitos que envolvem
o tema, o Cimi entende que o governo deve organizar uma força tarefa
para, dentre outras medidas urgentes e estruturantes: a) destravar os
processos de demarcação, tanto no campo administrativo, quanto no campo
judicial; b) ouvir os povos indígenas; c) revogar os próprios
instrumentos de ataque aos povos, tais como, as portarias 419/2011 e
303/2012 e o Decreto 7957/2013; d) mobilizar sua ampla base de apoio no
Congresso a fim de que se evite os retrocessos almejados pelos
ruralistas quanto aos direitos dos povos.
Brasília, DF, 03 de junho de 2013.
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