No capítulo 7 do Evangelho de Lucas, Jesus continua
abrindo o caminho, revelando o Novo. A transformação vai acontecendo.
Jesus acolhe o pedido de um estrangeiro não judeu (Lucas 7,1-10) e
ressuscita o filho de uma viúva (Lucas 7,11-17). A maneira de Jesus
conceber o Reino surpreende cada vez mais aos irmãos judeus que não
estavam acostumados com a abertura de Jesus. Até João Batista fica meio
perdido e manda perguntar: "É o senhor ou devemos esperar por outro?"
(Lucas 7,18-30). Jesus chega a denunciar a incoerência dos seus
patrícios: "Vocês parecem crianças que não sabem o que querem!" (Lucas
7,31-35). E agora, aqui no nosso texto, outro aspecto do Novo começa a
aparecer. É a atitude de Jesus para com as mulheres.
Na época do Novo Testamento, a mulher vivia
marginalizada. Na sinagoga ela não participava, na vida pública não
podia ser testemunha. Muitas mulheres, porém, resistiam contra a
exclusão. Desde os tempos de Esdras, a resistência da mulher vinha
crescendo, como transparece nas histórias de Judite, Ester, Rute, Noemi,
Suzana, da Sulamita e de tantas outras. Esta resistência encontrou eco e
acolhida em Jesus. No episódio da moça do perfume transparecem o
inconformismo e a resistência das mulheres no dia-a-dia e o acolhimento
que Jesus lhes dava.
COMENTANDO
1. Lucas 7,36-38: A situação que provocou o debate
Três pessoas totalmente diferentes se encontram:
Jesus, o fariseu e a moça! Um fariseu era um judeu observante. Da moça
se diz que era pecadora. Jesus está na casa de Simão, o fariseu que o
convidou para o jantar. A moça entra, coloca-se aos pés de Jesus, começa
a chorar, molha os pés de Jesus com as lágrimas, solta os cabelos para
enxugá-los, beija e unge os pés com perfume. Soltar os cabelos em
público era um gesto de independência. Jesus não se retrai nem afasta a
moça, mas acolhe o gesto dela.
2. Lucas 7,39-40: A reação do fariseu e a resposta de Jesus
Jesus estava acolhendo uma pessoa que, conforme os
judeus observantes, não podia ser acolhida. O fariseu, observando tudo,
critica Jesus e condena a mulher: "Se este homem fosse um profeta,
saberia que tipo de mulher é esta que o toca, pois é uma pecadora".
Jesus usa uma parábola para responder à provocação do fariseu. A
parábola ajuda a perceber o invisível de Deus a partir da experiência
que a pessoa tem da vida.
3. Lucas 7,41-43: A parábola dos dois devedores
Um devia 500 reais, o outro, 50. Nenhum dos dois
tinha como pagar. Ambos foram perdoados. Qual dos dois terá mais amor?
Resposta do fariseu: "Amará mais aquele a quem mais se perdoa!" A
parábola supõe que os dois, tanto o fariseu como a moça, tinham recebido
algum favor de Jesus. Na atitude que os dois tomam diante de Jesus,
mostram como apreciam o favor recebido. O fariseu mostra o seu amor, a
sua gratidão, convidando Jesus para o jantar. A moça mostra o seu amor, a
sua gratidão, através das lágrimas, dos beijos e do perfume.
4. Lucas 7,44-47: O recado de Jesus para o fariseu
Depois de receber a resposta do fariseu, Jesus aplica
a parábola. Mesmo estando na casa do fariseu, a convite do mesmo, ele
não perde a liberdade de falar e de agir. Defende a moça contra a
crítica do judeu praticante. O recado de Jesus para os fariseu de todos
os tempos é este: "Aquele a quem pouco foi perdoado, mostra pouco amor!"
O fariseu achava que não tinha pecado, porque observava em tudo a lei. A
segurança pessoal que eu, fariseu, crio para mim pela observância das
leis de Deus e da Igreja, muitas vezes me impede de experimentar a
gratuidade do amor de Deus. O que importa não é a observância da lei em
si, mas sim o amor com que observou a lei. E usando os símbolos do amor
da moça, Jesus dá o troco ao fariseu que se considerava em paz com Deus:
"Você não me deu água para lavar os pés, não me deu o beijo de
acolhida, não me deu água de cheiro! Simão, apesar de todo o banquete
que me ofereceu, você tem pouco amor!"
5. Lucas 7,48-50: Palavra de Jesus para a moça
Jesus declara a moça perdoada e acrescenta: "Tua fé
te salvou! Vai em paz!" Aqui transparece a novidade da atitude de
Jesus. Ele não condena, mas acolhe. E foi a fé que ajudou a moça a se
recompor e a se reencontrar consigo mesma e com Deus. No relacionamento
com Jesus, uma força nova despertou dentro dela e a fez renascer.
6. Lucas 8,1: Os doze que seguem Jesus
Numa única frase Jesus descreve a situação: Jesus
anda por toda parte, pelos povoados e cidades da Galileia, anunciando a
Boa Nova do Reino de Deus e os doze estão com ele. A expressão "seguir
Jesus" (Marcos 15,41) indica a condição do discípulo que segue o Mestre,
24 horas por dia, procurando imitar o seu exemplo e participando do seu
destino.
7. Lucas 8,2-3: As mulheres seguem Jesus
O surpreendente na atitude de Jesus é que, ao lado
dos homens, há também mulheres "junto com Jesus". Lucas coloca os
discípulos e as discípulas em pé de igualdade, pois ambos seguem Jesus.
Ele também conservou os nomes de algumas destas discípulas:
- MARIA MADALENA, nascida na cidade de Magdala. Ela tinha sido curada de sete demônios;
- JOANA, mulher de Cuza, procurador de Herodes Antipas, que era governador da Galileia;
- SUZANA e várias outras. Delas se afirma que "seguem Jesus" (cf. Marcos 15,41) e que o "servem com seus bens".
ALARGANDO
O Evangelho de Lucas sempre foi considerado o
Evangelho das mulheres. De fato, Lucas é o que traz o maior número de
episódios em que se destaca o relacionamento de Jesus com as mulheres.
Mas a novidade, a Boa Nova de Deus para as mulheres, não está
só na abundante citação da presença delas ao redor de Jesus, mas
sobretudo na atitude de Jesus em relação a elas. Jesus as toca e
deixa-se tocar por elas sem medo de se contaminar. À diferença dos
mestres da época, ele aceita mulheres como seguidoras e discípulas. A
força libertadora de Deus, atuante em Jesus, faz a mulher se levantar e
assumir sua dignidade. Jesus é sensível ao sofrimento da viúva e se
solidariza com a sua dor. O trabalho da mulher preparando o alimento é
visto por Jesus como sinal do Reino. A viúva persistente que luta por
seus direitos é colocada como modelo de entrega e doação. Numa época em
que o testemunho das mulheres não era aceito como válido, Jesus escolhe
as mulheres como testemunhas da sua morte, sepultamento e ressurreição.
Nos evangelhos, conservam-se várias listas com os
nomes dos 12 discípulos que seguiam Jesus. Havia também mulheres que
seguiam Jesus, desde a Galileia até Jerusalém. O Evangelho de Marcos
define a atitude delas com três palavras: seguir, servir, subir até
Jerusalém. Os primeiros cristãos não chegaram a elaborar uma lista
destas discípulas que seguiam Jesus como o fizeram com os homens. Mas os
nomes de sete destas mulheres estão espalhados pelas páginas dos
evangelhos:
1. Maria Madalena (Lucas 8,3)
2. Joana, mulher de Cuza (Lucas 8,3)
3. Suzana (Lucas 8,3)
4. Salomé (Marcos 15,40)
5. Maria, mãe de Tiago (Marcos 15,40)
6. Maria, mulher de Clopas (João 19,25)
7. Maria, a mãe de Jesus (João 19,25).
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