por Instituto Humanitas Unisinos (IHU)
É certo que o Cristo já veio, mas foi para fazer seus
todos os nossos sofrimentos. E, fazendo-os seus, Ele os realizou,
suportou-os e venceu-os. O que agora nos é anunciado é que, tendo feito
seus os nossos sofrimentos, Ele vem para fazer nossa a sua própria
glória.
Escatologia e apocalipses
O Evangelho de hoje, paralelo a Mateus 24 e Lucas 21,
é chamado de "escatológico", ou seja, refere-se ao fim dos tempos. Este
tipo de texto pode ser chamado também de "apocalíptico": apocalipse
significa "revelação", desvelamento. Podemos então dizer tratar-se de
revelações referentes ao final dos tempos, um gênero literário que se
faz presente também no Antigo Testamento, particularmente em Ezequiel e
Daniel. Alguns destes textos fazem menção de catástrofes de tipo
"sobrenatural", tal como o evangelho de hoje; já outros, falam de
terremotos, tsunamis, guerras generalizadas, perseguições aos que creem;
ou seja, coisas de que já temos experiência. O Apocalipse de João
expressa tudo isso em linguagem simbólica, fazendo desta "revelação" uma
mensagem um tanto quanto obscura! Paulo não é muito dado a este gênero
literário; prefere escrever, como em Romanos 8,22, "que a criação
inteira geme e sofre as dores do parto". E situa estas dores, não no
futuro, mas no presente. Além disso, diz tratar-se, não de destruição,
mas de nascimento, do acabamento da criação. Devemos compreender que os
apocalipses querem nos dizer que tudo o que temos que viver tem um
sentido, uma face escondida; e que tudo se passa como se Deus,
aparentemente vencido pelo mal, tomasse de fato o poder, utilizando para
isso tudo o que é nocivo, tudo o que é contrário ao amor.
A alegria está à nossa porta.
Estes textos das Escrituras nos dão a impressão de
que muitos males e sofrimentos nos são prometidos. Mas o que eles na
realidade estão mostrando é o sentido do que já vivemos todos os dias.
Em primeiro lugar, o nosso conflito com a natureza que não deixa nunca
de nos pôr à prova até que, finalmente, nos reduza ao pó. Acrescente-se a
isto o conflito que divide os homens devido a interesses, invejas e
ciúmes ou pela vontade de dominação nascida do medo de não ser senhor da
situação ou de ter que provar a superioridade... Resumindo, vivemos num
universo profundamente dividido e, portanto, homicida. É inútil colocar
tudo isso no futuro: o fim dos tempos já está aqui e, de qualquer modo,
já se ergue no horizonte. Os textos dizem que este imenso conflito não
irá se atenuar, mas vai até ao paroxismo, à medida que se aproxima de
seu fim. Quanto a cada um de nós, e isto vale para todos na medida em
que nos fazemos somente um, transpomos o limite que nos separa da paz
final a cada vez que aceitamos fazer do amor a nossa lei. O que
denominamos eternidade está, pois, às nossas portas. Ela é, de qualquer
forma, o inverso do cenário com que nos deparamos neste mundo, um
cenário quase sempre catastrófico. Uma vez mais ainda, é preciso dizer
que tudo, até mesmo o que há de pior, é usado por Deus para nos fazer
alcançar o reino da alegria. Mas atenção! Que tudo seja usado não quer
dizer que tenha sido também produzido por Deus. Deus é inocente com
respeito ao nosso mal. Mas faz disto um instrumento para o que chamamos
"salvação". Quanto ao resto, tudo nos foi já revelado na Paixão do
Cristo. E esta Paixão, que contém as paixões todas de cada um de nós, é
que é o verdadeiro Apocalipse.
Através de nossas cruzes, chegamos à glória.
Os textos que lemos hoje apresentam o caos atual e o
que está por vir como o lugar da vitória do Cristo. O que, numa outra
linguagem, confirma o que acabamos de dizer. Tudo, portanto, "acaba
bem". Quando estamos afogados no luto, no sofrimento, no absurdo, no
insustentável, estamos diante da escolha entre a fé na vida, n'Aquele
que é a vida, e a morte. Como diz Paulo no texto citado acima, a criação
está sempre a caminho; e nós também estamos a caminho. É preciso
escolher acreditar, mas a nossa fé também está a caminho e só alcançará a
plenitude quando desaparecer, dando lugar à visão, à experiência. E
nossa fé atual é já como que uma incursão nesse domínio radioso da
verdade enfim totalmente revelada. Nossa fé não é posta em coisas, mas
em Alguém. Fé e amor são, de fato, ligados (veja a expressão "fé
conjugal"). Por isso, todas as passagens apocalípticas dos evangelhos
falam do retorno do Cristo, ou melhor, de sua vinda, a propósito das
catástrofes naturais ou humanas que descrevem. É certo que o Cristo já
veio, mas foi para fazer seus todos os nossos sofrimentos. E, fazendo-os
seus, Ele os realizou, suportou-os e venceu-os. O que agora nos é
anunciado é que, tendo feito seus os nossos sofrimentos, Ele vem para
fazer nossa a sua própria glória.
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