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terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Diógenes e a Lâmpada - Pe. Alfredo J. Gonçalves, Assessor das Pastorais Sociais - Adital


Diz a história (ou a lenda) que o filósofo cínico Diógenes passeava pelas ruas de Atenas, Grécia, em plena luz do dia, com uma lâmpada acesa nas mãos. A quem lhe interrogava sobre um comportamento tão estranho, respondia: "Procuro um homem!”. Os filósofos, sábios, loucos e profetas costumam agir assim: com frequência falam mais com determinadas atitudes simbólicas do que com as palavras. O Brasil ou a capital federal estão mais do que necessitados de uma figura como Diógenes. Desta vez para procurar não um homem, mas um ministro. Da mesma forma que não faltavam pretensos homens na histórica cidade Atenas, tampouco faltam candidatos a ministro no Planalto Central ou no território nacional. Que o digam os partidos ao disputarem com unhas e dentes tais fatias do poder. O que falta é a condição ética para ser um homem, no caso de Atenas, e para ser um ministro, no caso de Brasília. A prática política desses funcionários privilegiados do governo, a levar em conta a avalanche de acusações que pesam sobre eles, deixa muito a desejar para a lisura e idoneidade do cargo que ocupam. O mais comum é que a riqueza ajude a conquistar o cargo e que este, por sua vez, aumente o patrimônio. Talvez não seja à toa que a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, esteja disposta em forma de pedras de dominó. A queda dos ministros, com efeito, faz lembrar a expressão "efeito dominó”. Uma a uma, desde Palocci até Lupi, seis pedras foram tombando, movidas pelos ventos da corrupção, das fraudes, do tráfico de influência, do enriquecimento ilícito, do nepotismo, do apadrinhamento, do corporativismo, além de outros vícios tão conhecidos e notórios na trajetória política brasileira. Longe de ser extirpado, o coronelismo oligárquico parece ganhar vida nova E a faxina a que se propôs a Presidente Dilma parece longe do fim. Na verdade, não faltam mecanismos de inibição ou punição para tais comportamentos. O exemplo mais à mão a Lei da Ficha Limpa, que hoje corre sério risco de ser abortada antes mesmo de posta em vigência. Seu exato oposto é a Imunidade Parlamentar, prevista no artigo 53 da Constituição Federal de 1988. Sob suas asas protetoras se escondem deputados e senadores, muitas vezes na função de ministros, para agirem ao abrigo da lei, com toda a liberalidade, autonomia e independência. Ao invés de "funcionários da população” tornam-se verdadeiros "senhores” que não conhecem limites para a exploração dos cofres públicos. A pesada carga tributária se encarrega de cobrir os ralos. Vale a pergunta: Será lícito que os legisladores de uma nação aprovem uma lei que os isenta de cumpri-la? São eles seres diferenciados, espécie de extraterrestres, acima dos cidadãos comuns? Estes pobres mortais, além de desconhecerem a imunidade parlamentar, são ainda mais vulneráveis pelo fato de, na maioria dos casos, não poderem arcar com os custos de um processo que costuma arrastar-se por anos ou décadas no labirinto do Poder Judiciário. O mesmo se aplica ao 14º e 15º salário, sem falar das formas diferenciadas de aumento dos rendimentos mensais e dos diversos "auxílios”: moradia, viagens, combustível, etc. Definitivamente, precisamos com urgência de um Diógenes em Brasília, de lâmpada acesa, à procura de um ministro! Os lanches do TJ-GO - Fr. Marcos Sassatelli, Frade Dominicano. Doutor em Filosofia e em Teologia Moral. Prof. na Pós-Graduação em DD.HH. (Comissão Dominicana Justiça e Paz do Brasil/PUC-GO). Vigário Episcopal do Vicariato Oeste da Arq. de Goiânia. Admin. Paroq. da Paróquia N. Sra. da Terra - Adital Pasmem! "Em 10 meses, TJ gasta meio milhão em lanches” (O Popular, 15/11/11, Manchete, 1ª página). Deire Assis, na coluna "Direito & Justiça”, afirma: "A relação dos pagamentos realizados pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) entre 1º de janeiro e 1º de novembro de 2011, conforme relatório da Diretoria Financeira e Divisão de Execução Orçamentária e Financeira do órgão disponível no Portal da Transparência no site da instituição na internet mostram que o Judiciário gastou no período mais de meio milhão com o custeio de despesas com lanches: R$ 519,9 mil”. A colunista continua dizendo: "Seis empresas constam como fornecedoras de despesas classificadas como ‘serviços de buffet’ e ‘fornecimento de lanches’. A maior despesa desta natureza (R$ 165,3 mil) ocorreu em fevereiro com fornecimento de lanches a magistrados e ao movimento de conciliação” (Ib. p, 8). Que afronta aos trabalhadores/as, que ganham o salário mínimo! Que desrespeito acintoso para com todos aqueles/as que - por causa da iniquidade de nossa sociedade hipócrita - sobrevivem dos restos de comida dos lixões! Por que tanta mordomia e tanto desperdício do dinheiro público? Que Tribunal de Justiça é esse? Quem vai investigar se o valor dos lanches foi ou não superfaturado e se alguém se aproveitou ou não do dinheiro público para seus interesses pessoais? Quem vai devolver aos cofres públicos o dinheiro gasto indevidamente? O TJ-GO deve - se é que tem - uma explicação à sociedade. Seria oportuno e certamente muito saudável que o TJ-GO, antes de usar irresponsável e inescrupulosamente o dinheiro público - que é dinheiro do povo - com suntuosos e requintados lanches ou com superfaturamento dos mesmos, lembrasse a situação de miséria em que vivem muitos de nossos irmãos e irmãs no mundo e no Brasil. No mundo, "cerca de 100 milhões de pessoas estão sem teto; 1 bilhão de analfabetos; 1,1 bilhão de pessoas vivem na pobreza, destas, 630 milhões são extremamente pobres, com renda per capta anual bem menor que 275 dólares; 1,5 bilhão de pessoas sem água potável; 1 bilhão de pessoas passando fome; 150 milhões de crianças subnutridas com menos de 5 anos (uma para cada três no mundo); 12,9 milhões de crianças morrem a cada ano antes dos seus 5 anos de vida” (www.webciencia.com - acessado em 05/11/11). No Brasil - que é o quinto país do mundo em extensão territorial, ocupando metade da área do continente sul-americano - nós temos "uma questão estrutural ao longo de séculos: sempre se produziu uma desigualdade econômica e social muito grande, e que continua. Vem diminuindo pouco. Márcio Pochmann, presidente do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), afirma que 10% ainda concentram um percentual de 70% da riqueza nacional, sendo que os 90% mais pobres têm acesso a apenas 25% a 30% da renda nacional. Na opinião dele, se a gente considerar as famílias donas de conglomerados econômicos, cinco mil famílias detêm mais ou menos 45% da renda brasileira, o que é uma concentração absurda. Em 2003, nós estávamos entre os quatro ou cinco piores países do mundo em distribuição de renda. Hoje estamos entre os 15, 20 países com a pior distribuição de renda do mundo. (...) No início dos anos 2000 tínhamos no Brasil em torno de 50 milhões de pessoas que, ou passavam fome diariamente, ou não tinham alimento suficiente regularmente. Hoje, diminuiu mais ou menos pela metade, mas temos ainda em torno de 16 milhões de pessoas que estão na extrema pobreza (...)” (Selvino Heck. A fome é uma criação humana. Entrevista, julho/11. Em www.pucrs.br). Os programas sociais - chamados programas de distribuição de renda - do Poder Público, sobretudo do Governo Federal, melhoram (pelo menos enquanto existem) a situação de miséria e fome do povo, amenizando seu sofrimento, mas não resolvem o problema na raiz. As causas da fome e da desigualdade socioeconômica são de caráter estrutural e são a consequência de um sistema econômico perverso, desumano e antiético. De fato, a fome no Brasil continua gritante. Trata-se de "uma tragédia a conta-gotas, dispersa, silenciosa, escondida nos rincões e nas periferias. Tão escondida que o Brasil que come não enxerga o Brasil faminto e aí a fome vira só número, estatística, como se o número não trouxesse junto com ele, dramas, histórias, nomes. Na inversão do ciclo da vida, proeza é criança viva, bebê recém enterrado, acontecimento banal. No Brasil, a cada cinco minutos, morre uma criança. A maioria de doenças da fome. Cerca de 280 a 290 por dia. É o que corresponderia, de acordo com o Unicef, a dois Boeings 737 de crianças mortas por dia”. Segundo o médico Flávio Valente -voluntário em campanhas contra a desnutrição e a fome- "existem, pelo menos, 36 milhões de brasileiros que nunca sabem quando terão a próxima refeição”. Sempre segundo o médico, há hoje na sociedade um comportamento que é comum e do qual todos nós somos responsáveis: "a aceitação (...) de que crianças ainda morram de fome no nosso país e que isso seja considerado natural” (Jussara Faustino. Fome no Brasil. Em: www.coladaweb.com.br – 25/11/11). Enfim, "do ponto de vista estrutural, a fome é resultado do tipo de sociedade que temos: uma sociedade capitalista que concentra renda exclui as pessoas, não permite que haja igualdade e uma melhor distribuição de renda. Então a razão estrutural é esta: uma sociedade que visa o lucro e o lucro acontece junto com o acúmulo de riqueza e de renda. Além disso, nós vivemos 20, 30 anos de neoliberalismo. O neoliberalismo significa: ‘Quem pode mais, chora menos’. Mas não se trata apenas da política econômica e social, é também uma política cultural, de valores, que influencia na maneira como as pessoas agem em relação umas às outras. Precisamos fazer um trabalho longo de reconstrução de valores de solidariedade” (Selvino Heck. A fome é uma criação humana. Ib.). Terminando, quero dizer: Se o TJ-GO meditasse sobre essa realidade iníqua, perversa e desumana, os lanches seriam certamente mais frugais e - quem sabe - não haveria superfaturamento ou desvio de dinheiro público. Uma outra sociedade é possível! Lutemos para que ela aconteça. Goiânia, 08 de dezembro de 2011

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